quarta-feira, 9 de maio de 2007

MAGNÓLIA

Magnólia (Magnolia, 1999)
Dirigido por Paul Thomas Anderson
Por Flávio Brun

Stanley entra em um estúdio de televisão acompanhado de seu pai, e acompanhamos os dois até que Stanley e seu pai se separam. Continuamos seguindo o pai de Stanley, que conversa com os pais de outras crianças que também estão no estúdio. Saindo da sala onde o pai de Stanley está, percorremos corredores até encontrarmos Stanley novamente, entramos em um elevador, saimos e encontramos Mary, a assistente de Jimmy Gator no corredor e começamos a segui-la. Em um filme comum, essa cena seria dividida em inúmeros cortes. Em "Magnólia", isso tudo é feito em apenas uma tomada.

Após o enorme sucesso de crítica e aceitação do público de "Boogie nights - prazer sem limites", o escritor e diretor Paul Thomas Anderson resolveu não perder tempo e começar um novo projeto. O resultado seria "Magnólia", um filme sobre as coincidências que ocorrem em nosso cotidiano sem sequer nos darmos conta. Uma história sobre família, relações destruídas e reconciliações.

No começo do filme somos apresentados a três histórias consideradas lendas urbanas nos Estados Unidos que demonstram como coincidências acontecem a todo o tempo: um homem assassinado por homens cujos sobrenomes formam o nome da cidade onde ele morava; um mergulhador encontrado morto em cima de uma árvore; um rapaz que tenta suicídio e é acidentalmente assassinado pela mãe. As histórias podem parecer forçadas, mas o objetivo é ilustrar que coincidências acontecem sim, e com maior freqüência que se imagina.

A história gira em torno de 9 personagens principais: Frank T. J. Mackey é um guru do sexo e tem um curso de sedução para homens e é filho de Earl Partridge, um velho produtor de programas de TV, com câncer e à beira da morte, cuidado por seu enfermeiro Phil Parma. Linda Partridge é a esposa de Earl, que casou com o velho apenas para receber a bolada após a morte do esposo, mas ao cuidar dele ela sente culpa e se arrepende do que fez. Jimmy Gator é o apresentador do programa de TV "O que as crianças sabem", em que adultos competem com crianças para ver quem sabe mais. Stanley Spector é o menino gênio que está há semanas no programa, sem errar uma, e a duas semanas de bater o recorde estabelecido por Donnie Smith, que tornou-se um perdedor ao crescer. Jim Curring é um policial da polícia de Los Angeles, que acaba conhecendo (e se apaixonando) por Claudia, a filha de Jimmy Gator. O filme percorre a trajetória desses personagens ao longo de um dia, mostrando de forma sutil as intersecções nas vidas dessas pessoas.

Filmes em geral não costumam ter mais de 3 narrativas simultâneas, e mesmo assim é costumeiro encontrar um que perde o fio da meada em algum ponto. "Magnólia" possui nove e em momento algum o filme perde o ritmo ou negligencia um personagem ou outro. Isso se deve ao roteiro genial de P. T. Anderson, que já havia experimentado acompanhar histórias de vários personagens em um único filme em "Boogie nights", porém em "Boogie" a história girava em torno de um personagem. Em "Magnólia" nenhum personagem é considerado principal, todos têm sua voz e seu tempo em tela suficiente para nos apegarmos a eles e sempre estarmos ansiosos para ver o rumo que suas vidas vão tomar.

O grande forte do filme, além de seu roteiro incrivelmente bem escrito, são as atuações de todo o elenco. É difícil encontrar um filme em que TODOS os membros oferecem atuações do calibre que encontramos em "Magnólia". Os destaques são Tom Cruise, como Frank T. J. Mackey e Juliane Moore como Linda. Cruise interpreta com excelência todas as variações de seu personagem, de um simples machista arrogante a um filho que não consegue perdoar mágoas passadas. A personagem de Juliane Moore é a única que tem algum problema de desenvolvimento na história - desde o começo ela já está desesperada sem saber o que fazer. Mesmo com a limitação da personagem, Moore oferece uma interpretação digna de reverência, e nos provém de algumas das cenas de maior impacto dramático da película.

O filme em aspectos técnicos é um espetáculo à parte. Uma das características dos filmes de Anderson é o grande número de enormes planos-seqüência (cenas longas sem cortes, como a descrita no parágrafo inicial que dura cerca de 3 minutos), e em "Magnólia" temos bons exemplos disso. As narrativas entrecaladas, unidas apenas pela mesma trilha de fundo, são um exemplo de edição. A trilha sonora, composta por várias músicas de Aimeé Mann (amiga do diretor, que escreveu o filme pensando nas músicas) dão um toque final a esse belíssimo trabalho artístico.

O modo de contar histórias paralelas entrecaladas tem sido largamente copiado nos últimos anos, com destaque a "Crash - no limite" e "Babel". Ambos os filmes tratam de como as coincidências do cotidiano afetam a vida das pessoas, e as conseqüências que o ato de um pode desempenhar na vida de vários. O impressionante é perceber que os dois exemplos citados acima são inferiores tanto em contúdo quanto em técnica, e mesmo assim obtiveram melhor recepção de público e crítica.

Apesar de pouco reconhecido, "Magnólia" é um dos melhores filmes dos anos 90, fruto da mente fértil de um talentoso roteirista e diretor. Provavelmente lembrado apenas por seu final, que merece uma análise à parte (e por isso nem foi mencionado aqui), "Magnólia" é muito mais que isso - é um filme que todos poderão se identificar com pelo menos um dos personagens e que mostra que filmes ainda podem surpreender quem os assiste.

4 comentários:

Márcio Zacarias disse...

Eu gostou muito do magnólia, mas acho que ele não foi muito aceito por ser muito longo. Filmes deste tipo muito longos acabam se tornando um pouco massantes. Acho que o Crash é um pouco menos massante por ser mais curto, por isso acabou sendo mais aceito pelo público geral.

Mas enfim, cada um na sua. Eu gosto dos dois e ainda não vi o Babel pra comentar.

Anônimo disse...

Taí um filme que preciso rever, olhei a primeira vez com uma cabeça não preparada pro filme, infantil, esperando outra coisa (apesar de lembrar de algumas coisas que mencionou como as longas cenas sem cortes).

abraço

Anônimo disse...

Flávio, eu adoro Magnólia. E concordo com o seu texto: a Julianne Moore está perfeita e o Tom Cruise está surpreendente.
Só não concordo que o filme seja "pouco reconhecido": 10 entre 10 críticos reverenciam Magnólia o tempo inteiro.
Este é, de longe, o melhor filme da carreira de todos os atores envolvidos (exceto do John C. Reilly, cujo melhor é o Chicago).
Abraços!
PS: Escreve mais textos legais que eu tô no trabalho sem nada pra fazer! Quero ler!! =)

Anônimo disse...

Olá, Flávio.

Gostei da sua crítica sobre Magnólia, mas há alguns pontos meio... complexos.

Se vc me permite:

1. Tom Cruse bom ator?! "...interpreta com excelência todas as variações de seu personagem..."?!
Indicações: Jeremy Irons, em O Reverso da Fortuna; Gary Oldman, em Minha Amada Imortal; Brandauer, em Mephisto; Hopkins, em O Homem Elefante;Mitchum no SU-BLI-ME A Filha de Ryan;O'Toole em Laurence da Arábia; Olivier, em Trama Diabólica; De Niro/Rourkey em Coração Satânico... Isso p dar uma simples idéia do que é ser ator. E isso, Tom Cruise nunca foi.

2. Essa questão das histórias paralelas é bem mais antiga do que vc pensa: tem seus inícios em 1919 com Intolerância, passando por Grande Hote... Short Cuts, o delicioso Boogie Nights e muuuuuuuutos outros.

Seus textos tb são legais, mas... o cinema francês, alemão, sueco estão aí. Dá um tempo em Hollywood. Lembra da Norma Desmond? Os clássicos... Em certo momento ela diz: "...naquele tempo tínhamos um rosto..."

Depois de assistir a algum dos que te indiquei, QUALQUER DELES, na verdade, NIN-GUÉM pode dar QUAL-QUER crédito ao Tom Cruise. Repito, QUAL-QUER CRÉDITO.

Grande abraço

Heleno