sexta-feira, 25 de maio de 2007

A ÚLTIMA SESSÃO DE CINEMA

A última sessão de cinema (The last picture show, 1971)
Dirigido por Peter Bogdanovich
Por Flávio Brun

Um filme nostálgico, porém sem idolatrias a uma era, "A última sessão de cinema" mostra o dia-a-dia de uma cidadezinha no interior do Texas no começo dos anos 50, onde a última era de ouro do cinema americano dava seu último suspiro.

A história é basicamente um drama adolescente, dando ênfase a três jovens - Sonny, Duane e Jacy. Os adultos aparecem durante o filme, porém seus personagens são meros coadjuvantes, mas ainda assim vitais para o desenvolver da história - os principais são a mãe de Jacy, Sam o Leão e Ruth. Ao começo do filme, os três jovens são colegas de escola e Jacy e Duane são namorados, para a inveja de Sonny, que tem uma queda por Jacy, que por sua vez tem o namoro desaprovado por sua mãe, que acha que Duane é pobre e não merece sua filha. Sonny é o protegido de Sam, que é dono de todos os locais de lazer da cidade - o bar, salão de sinuca e cinema. A película cobre o período de aproximadamente um ano e meio da vida desses personagens em uma cidade vazia e monótona. O filme teria sido melhor se tivesse dado mais ênfase aos personagens secundários, cujos dramas não foram suficientemente trabalhados - principalmente Ruth, a esposa do treinador e a mãe de Jacy, infeliz no seu casamento de conveniência.

Um roteiro com adolescentes como protagonistas pode se tornar uma armadilha quanto ao rumo de seus personagens, sendo fácil desperdiçar um bom enredo para criar apenas mais uma comédia acéfala ou uma história apenas com drogas, sexo e rock 'n roll. Em "A última sessão de cinema" temos a presença de sexo em alta dose, porém apenas simbolizando o pensamento da era e o começo da liberdade sexual que veio a explodir uma década depois. Os jovens do filme têm alma, não sendo apenas um estereótipo de pessoas que apenas pensam com seus genitais. Em suas jornadas, acompanhamos suas frustrações, dramas pessoais e desejos, sendo possível nos identificarmos com esses personagens que não são apenas sombras projetadas em uma tela de cinema, e sim pessoas de carne e osso com problemas reais que toda pessoa normal tem.

O elenco do filme é composto por atores que hoje são conhecidos, porém aqui estão em seus primeiros papéis de destaque, e se saem muito bem em suas interpretações. Jacy é interpretada por Cybill Shepherd (mais conhecida por seu papel na minissérie "A gata e o rato" e no filme "Taxi driver"), em um papel difícil para uma atriz novata, pois Jacy é uma menina ousada e sem sentimentos pelos rapazes com quem sai. Ellen Burstin (a famosa mãe da menina possuída pelo demônio em "O exorcista) interpreta a mãe de Jacy e, apesar de não ganhar muito destaque, cumpre seu papel muito bem. Duane é interpretado por Jeff Bridges, sendo o elo mais fraco de um bom elenco.

A iniciativa de filmar o filme em tons de cinza (não preto-branco pois cinza é diferente de preto e branco!) foi uma decisão acertada, pois a falta de cores nos aumenta a sensação de desolação do lugar e das pessoas que lá vivem. Como não se trata de um filme onde a felicidade parece ter abandonado a vida da maioria dos personagens, cores não cairiam bem aqui. Além de ressaltar o clima do filme, todo o trabalho artístico envolvido na produção do filme atinge o objetivo de transportar-nos direto à década de 50, tornando crível a que essa produção de 1971 tenha sido feita vinte anos antes. As locações do filme utilizam de uma cidade pequena, vazia, quase deserta, o que amplia ainda mais a sensação de vazio na vida dos personagens.

O título "A última sessão de cinema" pouco tem a ver com a história de seus personagens, se referindo ao cinema que é forçado a fechar devido à crise que a indústria cinematográfica enfrentou com a popularização da televisão. As pessoas, na época, abandonaram o costume de ir ao cinema para fins de entretenimento e informação (antes dos filmes costumavam passar notícias) para ficar em casa pois o pensamento geral era "para que pagar se eu posso assistir de graça no conforto do meu sofá?".

Dois anos depois de seu lançamento, "A última sessão de cinema" viria a influenciar o jovem diretor George Lucas ao filmar "American Graffiti - Loucuras de verão", um filme sobre um grupo de amigos adolescentes que passam uma noite fazendo o que todo jovem sabe fazer - transar, beber e entrar em confusão. Apesar da diferença de abordagem dos jovens, a influência é clara - trazer à tona uma visão nostálgica de uma década que já passou usando a vida de adolescentes para explicitar o que foi perdido.

Um clássico exemplo de filme cujo tema é nostalgia, esse filme sucede aos demais do gênero por não tentar glorificar a era que já terminou e sim apenas apresentar a vida da época com realismo. Um ótimo retrato de um período que jamais será esquecido por amantes da arte de se fazer cinema e nem por amantes de uma época em que a vida era mais simples.

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